edição:Velho Conselheiro Ze de Mello a 20.2.06

Como resultado de mais uma troca de correios electrónicos, editamos hoje uma entrevista com António Abernú, um jovem elvense, que desde a Covilhã, nos relata o seu percurso de encenador à frente da ASTA – Associação de Teatro e outras Artes do Distrito de Castelo Branco e do www.teatrovirtual.net respondendo às curiosidades deste velho Conselheiro.

Como é que alguém que sai de Elvas para frequentar Engenharia Aeronáutica acaba como encenador de teatro?
No segundo ano do curso – 1992, entrei para o Teatrubi – Grupo de Teatro da Universidade da Beira Interior. O “bichinho” do teatro foi ganhando terreno aos aviões. Em 1996 acabei por deixá-los e fui para Évora fazer um curso de formação de actores. A encenação começa por um convite do próprio Teatrubi depois de ter terminado o curso de actores. Desde ai que direccionei mais o meu trabalho para a encenação, principalmente na ASTA.
Continua mantendo alguma ligação a esta sua terra natal?
Os meus pais, alguns amigos, recordações e as noticias que vou sabendo.

Teatro subsidio-dependente ou Teatro para todos?
Teatro para todos, sem duvida. Contudo, a subsídio – dependência sob a forma de incentivo e ajuda a novos projectos será obrigatória. As estruturas e principalmente os novos projectos devem ter injecção de dinheiro do estado – um investimento na cultura do país. Apesar de termos de olhar o Teatro e as estruturas hoje em dia, de uma outra forma, com ligações e parcerias com instituições, empresas, espaços e as próprias pessoas, para se poderem melhor sustentar e assim chegar a mais públicos.
Como vê um homem da cultura o investimento em novos museus, auditórios e pavilhões multiusos na sua terra berço?
Só posso ver com bons olhos. A maioria das vezes as politicas menosprezam a cultura, esquecendo sempre que faz parte da identidade de um pais, de uma região e das próprias pessoas. Alem do mais esses espaços tem posto de trabalho, visitantes, movimento de obras e acima de tudo “vida” e comunicação entre as pessoas.
Por outro lado estão a ser criadas redes de espaços culturais no nosso país. Será oportuno e necessário que Elvas também os tenha, como forma de acolher eventos e produzi-los.
E não podemos esquecer que as novas formas de entretenimento estão a ganhar novas dimensões e formas, significantemente lucrativas.
O que me preocupa é as pessoas que estão afrente desses espaços. As pessoas que os gerem e programam, os animadores e as pessoas que trabalham na criação de novos públicos. A formação é deverás essencial – para melhor formação dos públicos, manutenção dos equipamentos e o próprio serviço prestado pelo espaços.
Caberia dentro da dimensão da cidade de Elvas uma companhia de teatro com representações frequentes?
Creio que sim. Pelo menos seria de se tentar.
Uma companhia de teatro em Elvas, alem de poder apresentar duas ou três produções por ano, certamente que também faria o papel de convidar e acolher espectáculos de outras companhias.
Por outro lado deveria fazer um trabalho concertado com as escolas e instituições da região. Levar o teatro a escola, a junta de freguesia, trabalhar com as crianças, os jovens, os adultos e ate os mais velhos. Serviços educativos, actividades didácticas e lúdicas nos museus e instituições seriam outra das acções que uma companhia poderia desempenhar em Elvas. Assim se poderia envolver muitas pessoas e criar novos públicos.
O projecto teatro digital foi um episódio ou terá continuidade?
O teatro virtual é um grande sonho meu que vou conseguindo realizar.
O projecto que já foi desenvolvido o ano passado faz parte do início de alguns outros que de alguma forma lhe estão associados. Um deles é a transposição do resultado final –filme/peça do teatro virtual para um espectáculo de palco onde vou “esquecer” as tecnologias que usei em prol de um trabalho centrado no actor.
Novas execuções do teatro virtual com correcções e aperfeiçoamentos estão pensadas, principalmente fora do país. Embora o projecto se realizasse num espaço comum ao “mundo”, o texto foi escrito em português e a maior participação foi obviamente portuguesa. Tenho vindo a trabalhar em prol de arranjar parceiros fora do pais para poder alargar os horizontes de uma nova execução do projecto e enriquece-la.
Ainda todo o meu trabalho de pesquisa e estudo sobre comunicação que obviamente esta relacionado com o projecto.
Apostar na cultura (teatro, dança, musica, etc) é um investimento no futuro. Se lhe oferecessem a cadeira do Ministério da Cultura qual seria a sua politica?
Recusaria certamente. Gosto muito de coordenar as pessoas e as dirigir ate, mas partindo do, e com o trabalho delas. Um ministro e o seu ministério não têm tempo nem hipóteses ou vontade de fazer trabalho de campo. Só assim creio possível entender os moldes em que se poderia construir uma politica cultural.
Por outro lado as politicas no nosso país – e não só, são ainda de acordo com ideologias e cores politicas, o que para mim penso já não ser exequível.
O chamamento de público ao teatro passa pelo teatro interventivo/interactivo?
Sim, cada vez mais. Quanto a mim uma das formas principais de criar novos públicos é a de desmistificar a arte e a cultura – uma pessoa que nunca dançou, nunca poderá saber se gosta de o fazer.
Mais do que espectáculos, acções de sensibilização de vários conteúdos que se criem em consonância com o mundo do teatro - serviços educativos de instituições e ateliers/workshops são disso um exemplo em pleno crescimento.
Dos vários trabalhos realizados no mundo cénico qual lhe daria prazer trazer às tábuas do Cine Teatro elvense? E quando terão os elvenses esse previlégio?
No ano de 2001 a ASTA enviou um ofício anexado de um caderno de produção do espectáculo para a infância: Pequeno Monstro, para a Câmara Municipal de Elvas ao cuidado da vereadora da cultura. Várias tentativas telefónicas para marcar uma reunião ou saber algo sobre a nossa proposta foram efectuadas da nossa parte, sem feedback algum.
O ano passado, quando do termino do projecto teatro virtual, enviamos em carta registada com uma proposta para apresentação ao publico do resultado do projecto, da qual, apenas recebemos a confirmação de entrega dos correios.
Como poderá constatar, não é por falta de iniciativa e vontade da minha parte. Quem sabe á terceira não é de vez…
Se tivesse que escolher um “décor” para uma representação de entre os monumentos de Elvas qual escolheria? Porquê?
Elvas tem cenários naturais e monumentos que só por si são extraordinários.
Sem duvida que seria um grande desafio – fazer um espectáculo performativo e multimédia no Aqueduto da Amoreira. Aqueles arcos transfigurados de vida, som e cor, seria certamente fantástico.
O grande papel da sua carreira foi…. E qual ambiciona dar corpo?
A minha carreira como actor está em stand by – nos últimos 3 anos tenho trabalhado mais como encenador e criador. Um dos papéis que mais trabalho e gozo me deu ao mesmo tempo, foi um Joanne de Gil Vicente no Auto da Fama.
Não sou fã das personagens dos clássicos ou dos grandes textos. Prefiro aquelas que reflectem e nascem dos nossos dias.

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